A gente pode entrar? Indiamara Sutili - Palhaça Miúda


A primeira vez que vi um palhaço no hospital eu fiquei hipnotizada, aquilo era tão mágico, maravilhoso e estranho ao mesmo tempo, afinal o hospital sempre foi visto como um local de seriedade, ordem e silêncio.

Entre as paredes brancas daquele ambiente, observava os palhaços cantando e cumprimentando as pessoas com um sorriso no rosto. Era tanta informação que as pessoas ficavam tímidas, sem palavras, afinal era um palhaço, uma figura muitas vezes vista apenas pela TV.

Quando a Miúda começou a fazer visitas no Hospital da Criança, era difícil identificar quando ela realmente estava sendo aceita naquele espaço. As vezes eram olhares desconfiados outras vezes eram olhares de curiosidade e as vezes o silêncio permanecia. Foi difícil no começo entender como funciona a aceitação de uma criança e um adulto, mas foi muito rápido entender que nenhuma delas é obrigada a aceitar um palhaço.

Certa vez assistindo um documentário sobre a palhaçaria hospitalar eu ouvi a seguinte frase: - O soro é obrigatório, o remédio é obrigatório os médicos são obrigatórios, o palhaço não. Entender que o quarto do paciente é como sua casa por alguns dias é fundamental, e com muito respeito a gente pára na porta do quarto e pergunta: - A gente pode entrar? Afinal ninguém é obrigado a aceitar uma visita indesejada na sua casa.

Me lembro de uma mãe com sua filha na ala pediátrica, uma mãe fragilizada e ao mesmo tempo ríspida, não aceitava a presença de ninguém no quarto da filha a não ser que fosse realmente necessário, ela não olhava pela janela do quarto, seus olhos ficavam apenas zelando a filha.

Sem julgamento e sem forçar, as palhaças tinham uma meta, fazer a mãe olhar para elas pela janela do quarto. Com muito cuidado e respeito depois de algumas tentativas as palhaças conseguiram com que a mãe as olhasse, e aí veio um sorriso. Um sorriso tímido, meio de canto da boca, um aceno, um gesto e um olhar.

Aceitar nossa presença também vem com um sorriso, um olhar, um gesto, respeitar o espaço do paciente também é aceitar que nem sempre as coisas vão ser claras, verbalizadas ou entendidas. As vezes o palhaço só precisa ouvir o silêncio, aceitar e ir embora.

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